sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Lucid Dreamming


"Nós somos do tecido de que são feitos os sonhos."
(William Shakespeare)

“Lucid Dreaming” de Stephen LaBerge.Infelizmente, este é um livro que ainda não possui uma edição em língua portuguesa. O excerto é praticamente o epílogo da referida obra e aborda um assunto que, se constitui como uma das mais importantes implicações da fenomenologia dos sonhos lúcidos. Quem estiver interessado em conhecer melhor o trabalho e obra do autor, recomendo a visita ao seguinte site da Web (de autoria do próprio LaBerge): www.lucidity.com.

(...)É provável que aquilo que foi dito em relação ao terço das nossas vidas que passamos a dormir também possa ser aplicado aos outros 2/3 – o estado a que chamamos vigília.

Comecemos com algumas das aplicações e implicações que a experiência do sonho lúcido sugere para a vida quotidiana. Até que ponto serão relevantes para a vida vigil, os conceitos do sonho lúcido? A resposta é que as atitudes que caracterizam o sonho lúcido possuem certos paralelismos com uma abordagem à vida que podemos apelidar de “vida lúcida”.



Durante o sonho não lúcido assumimos tacitamente que estamos acordados, enquanto que no sonho lúcido nós sabemos que estamos a dormir e a sonhar. Creio que o par de atitudes correspondentes se podem processar também no estado de vigília da seguinte forma: por um lado, podemos assumir, de forma não lúcida, que estamos objectivamente a experimentar a realidade. De acordo com esta perspectiva, a percepção parece ser um assunto simples e que se reduz meramente a olhar pela janela dos nossos olhos e observar o que está lá fora. Infelizmente, este ponto de vista tradicional e do senso comum parece ser claramente inconsistente com as descobertas da psicologia e neuropsicologia modernas. O que nós vemos não é o que está “lá fora”; de facto, não existe sequer um “lá fora”. O que nós vemos e sentimos é apenas um modelo mental, dentro da nossa cabeça, daquilo que percepcionamos ou acreditamos estar “lá fora”.



A compreensão lúcida da natureza da percepção deriva do actual conhecimento acerca do funcionamento cerebral. Seguindo esta abordagem, proponho a hipótese de trabalho de que todas as nossas experiências são necessariamente subjectivas: elas são o resultado da nossa própria construção baseada no nosso estado motivacional, bem como naquilo que vemos e acreditamos ser a realidade. Um bom exemplo desta afirmação são as ilusões ópticas que podem ocorrer como resultado das expectativas. Resumindo, poderemos dizer que a análise mais correcta acerca da percepção é que nós não experimentamos a realidade de forma directa mas sim através de modelos do mundo. Desta forma, antes de sermos capazes de ver o que está “lá fora”, a informação visual dos nossos olhos tem de passar por uma série de factores subjectivos tais como as expectativas, sentimentos, conceitos, valores e atitudes.



Para a Psicologia Esotérica, o estado a que habitualmente chamamos de vigília/acordado está tão longe de ver as coisas como elas são na “realidade objectiva” que mais poderia ser apelidado de “sono” ou “sonho”. Bertrand Russel chega a esta mesma conclusão percorrendo no entanto um caminho diferente. Segundo este autor, se acreditarmos no que diz a física actual, então os “sonhos” a que chamamos percepções vigis têm apenas mais uma pequena semelhança com a realidade objectiva do que os fantásticos sonhos do sono.



Filósofos à parte, se lhe perguntassem “Estás acordado?” provavelmente iria responder “Com certeza!”. Infelizmente, estar certo de que estamos acordados não fornece nenhuma garantia disso mesmo.

Como sabe que está acordado neste preciso momento? Poderá dizer que sim porque se lembra de ter acordado hoje de manhã. Mas isso poderá ter sido apenas um falso acordar, e pode estar a enganar-se a si próprio sonhando que já não está a sonhar. Talvez aquilo que julgamos ser um “verdadeiro acordar” seja apenas mais um grau de acordar parcial ou falso.



Tentemos perguntar verdadeiramente, uma vez mais, a nós próprios: “Estou acordado?”. Notará o quão difícil é levantar genuinamente esta questão. Perguntar sinceramente se estamos realmente acordados requer uma dúvida honesta e isto não é um assunto fácil para a maioria. Mas duvidar do “induvidável” é o negócio dos filósofos. Como Nietzche coloca a questão: “…além desta realidade em que vivemos e temos o nosso Ser, uma outra, e completamente diferente, realidade permanece fechada e é por sua vez também uma aparência”



Como podemos nós não estar totalmente acordados? É possível que tenhamos um sentido superior (eg. uma forma de intuição) que normalmente permanece adormecido quando os nossos sentidos “inferiores” mas mais conhecidos estão acordados. Assim, como foi acima sugerido, a experiência a que chamamos vigília/acordado e consideramos completa, pode ser de facto apenas um acordar parcial e apenas parte da verdadeira realidade.

Como Orage escreveu: “Podemos temer a existência de uma morbidez nas decorrentes especulações; e que um esforço para ver as nossas vidas vigis como meramente uma forma especial de sono implica uma diminuição da sua importância para nós. Mas esta atitude perante um facto possível e provável é por si só morbidamente tímida. A verdade é que, tal como nos sonhos nocturnos o primeiro sintoma de acordar é suspeitar de que estamos a sonhar, o primeiro sintoma de acordar da vida vigil é a suspeição de que o nosso presente estado é semelhante a um sonho. Estarmos conscientes de que estamos apenas parcialmente acordados é a primeira condição para nos tornarmos e ficarmos nós próprios verdadeiramente mais despertos.



Dada a virtual impotência do raciocínio filosófico para levantar genuinamente a suspeição de que estamos apenas parcialmente acordados, existe felizmente um meio mais eficaz de abordar esta questão. Esta abordagem, o que não constituirá nenhuma surpresa, é o Sonho Lúcido. Os sonhos lúcidos podem objectivamente mostrar-nos como é pensar que estamos acordados e descobrir que afinal isso não é verdade. O sonho lúcido pode ser um ponto de partida para a compreensão de como podemos não estar totalmente despertos – assim como o sonho normal está para o sonho lúcido, o comum estado vigil pode estar para o verdadeiro estado desperto. Esta capacidade dos sonhos lúcidos – preparar-nos para um acordar mais completo e verdadeiro, pode vir a provar ser o potencial mais significativo para nos ajudar a ficar mais vivos nas nossas vidas(...)

Fonte: http://sites.google.com/site/arcadesonhos/afilosofiaonirica

Da Realidade e do Sonho


"O que vejo, o que sou e suponho não é mais do que um sonho num sonho."

(Edgar Allan Poe)



Mas afinal o que é a realidade?

A definição do senso-comum mais abrangente seria provavelmente: “Tudo o que existe”.

Os cientistas em geral usam frequentemente o termo “realidade” como um sinónimo para “Universo físico”. Contudo, de acordo com a neurofisiologia actual, o universo físico apenas existe hipoteticamente, uma vez que apenas o podemos experimentar de forma indirecta através de estimulações neurais. É aquilo a que podemos chamar de “Experiência-no-Corpo”- IBE (In the Body Experience) na terminologia anglo-saxónica.
De acordo com esta teoria, a realidade física que de facto experimentamos parece ser apenas uma estimulação imperfeita e uma abstracção de um universo físico cuja existência apenas podemos inferir, e nunca directamente corroborar.
Contrastando com esta posição podemos assumir uma atitude descritiva ao usar o termo realidade. Assim, de um ponto de vista fenomenológico, o termo realidade refere-se ao mundo da experiência directa, o mundo em que vivemos. Nesta perspectiva, a realidade experimentada nos sonhos ou noutros estados alterados da consciência (como em estados meditativos ou provocados pelo consumo de substâncias psicoactivas) não é menos válida que a realidade experimentada no normal estado de consciência, aquele em que nos encontramos durante a vigília, na maior parte do dia. Ou seja, os sonhos e a vigília são apenas modos distintos de percepção da realidade.
Um estado de consciência é como um filtro ou lente, através do qual vemos o mundo. Assim, durante a vigília experimentamos a realidade de uma determinada forma, somos inundados por estímulos perceptivos. No sonho experimentamos a realidade segundo um modo perceptivo diferente, um modo em que estamos “fechados” para o mundo exterior. O mesmo se passa num sonho lúcido ou numa trip sob efeito de cannabis; cada estado tem a sua realidade característica.
Infelizmente, na nossa sociedade o termo “sonho” adquire sentidos indesejáveis que prejudicam a nossa compreensão da sua real natureza e importância. Por exemplo, muitas pessoas usam frequentemente a frase: “Foi apenas um sonho”. Isto assenta muito bem na perspectiva comum de que os sonhos não são reais e portanto não são importantes, não são dignos de uma atenção séria, sendo melhor esquecer do que lembrar.
Em relação à natureza dos sonhos, cada indivíduo normalmente efectua um juízo, uma assumpção em sintonia com os seus preconceitos pessoais e/ou culturais (Kellogg, 1989). Por exemplo:
1.Sonho = simplesmente as projecções subjectivas do cérebro adormecido de uma pessoa.

2.Sonho = Um mundo espiritual totalmente diferente e independente.

3.Sonho = Um reino parapsicológico com elementos tanto objectivos como subjectivos.

4., 5., etc…

Uma vez realizados, estes juízos cristalizam-se e tornam-se praticamente inquestionáveis.
Alguns cientistas certamente acreditam que uma aceitação inquestionável da actualmente popular teoria do sonho tal como sumariado no juízo 1., define a verdadeira natureza dos sonhos. Mas para muitos outros, tal definição parece ser simultaneamente limitativa e ingénua. O mundo onírico constitui-se como um universo próprio, uma realidade com as suas próprias leis e, tal como as outras realidades, é uma criação da nossa própria mente.

Fonte:
http://sites.google.com/site/arcadesonhos/afilosofiaonirica